Total de visualizações de página

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

SABIÁ

Depois que me tornei um vagabundo – isso faz tempo – passei a acordar mais cedo pra ficar mais tempo sem fazer nada.
Domingo, sete horas da manhã, abri o portão para olhar a rua: vi dois sabiás ciscando na grama junto à linha férrea. Eles também me viram.

Atravessaram a rua e vieram para a minha calçada. Chegaram muito perto de mim, a quase dois metros. Era um lindo casal me olhando e eu admirando-o por mais de dez minutos.

Até que veio o caminhão de lixo e voaram. Pousaram na cerca da linha férrea e uma outra dupla de sabiás foi ao seu encontro. Parecia uma família.

Olhando aquelas aves que como eu não querem saber da praia, lembrei de Gonçalves Dias e do III Festival Internacional da Canção.

Em 1968, final da fase nacional do festival, lá estava eu no Maracanãzinho lotado. Quase todos torcíamos por Geraldo Vandré e sua canção de protesto “Pra não dizer que não falei das flores”. Chegamos a vaiar Chico Buarque e Tom Jobim e nem permitimos que se ouvisse Cinara e Cibelle interpretando “Sabiá”, a canção vencedora.

A emoção que nos transmitia a canção de Vandré, que se tornou um hino do movimento estudantil contra a ditadura, não nos deixava ver que “Sabiá” era também uma canção de protesto contra os gorilas.

A letra de “Sabiá” não era tão explícita quanto a outra, mas se a compararmos com a “Canção do Exílio”, veremos o protesto implícito e quase imperceptível.

Certamente, Chico Buarque se inspirou em Gonçalves Dias para escrevê-la e, logo após, foi exilado do país.  
Gonçalves Dias, na França, cantou a saudade que sentia do Brasil e o Chico, no Brasil da ditadura, cantou a saudade que tinha do Brasil democrático e livre da tirania militar.

No vídeo abaixo, o som do Maracanãzinho naquela noite. Prestenção que vai ouvir a minha voz no meio da multidão.

Nenhum comentário: